Após inúmeros anos de acirrados debates e estudos profundos no mundo acadêmico, alcançamos o desenho constitucional do dano moral e a determinação de sua indenizibilidade.
Em linguagem simples, significa que o primeiro e principal óbice a essa construção jurídica que residia na imoralidade de se fixar valor à moral alheia, valor intangível, imaterial, não suscetível de quantificação pecuniária, restou superado pela constatação de que nenhuma lesão ou ameaça de lesão a direito alheio pode restar infensa de sanção, mesmo que situadas no âmbito dos direitos imateriais, mas, sem natureza indenizatória, de recomposição do dano com a apuração material do valor correspondente ao dano efetivamente causado, mas, de índole pedagógica, punitiva ao ofensor, e compensatória para o ofendido.
Montou-se, a partir daí, a equação para a aferição do dano moral. Constatada a ofensa, incumbe ao órgão judicante fixar o seu valor, pedagógica e punitivamente, considerando a pujança econômica do ofensor, a gravidade da ofensa e sua repercussão, e as qualidades do ofendido, de tal forma a coibir a repetição da prática pelo ofensor, no plano individual, e inibir práticas semelhantes por qualquer agente, no plano social, compensando, de certa forma, o ofendido com a percepção dos valores resultantes da condenação.
Rapidamente, o que não surpreende, assim como a secular indústria da pensão alimentícia, surgiu a indústria do dano moral. São conhecidas incontáveis estratégias de que se valem indivíduos para provocar situações que, potencialmente, possam se reverter em indenizações por dano moral.
Bem exemplifica esse fato absolutamente reprovável, um caso ocorrido, salvo engano, no Rio de Janeiro, RJ, onde um indivíduo bem trajado (terno e gravata), dirigiu-se a uma agência bancária e ao tentar entrar, foi barrado na porta eletrônica. Os encarregados pela segurança pediram ao indivíduo que depositasse em compartimento próprio, os objetos metálicos que eventualmente carregasse. O homem atendeu, depositando chaves, algumas moedas, relógio, aparelho celular e, até o cinto, por causa da fivela metálica. Mais uma vez, tentou o ingresso no banco e foi barrado. O alarme, novamente, disparou e travou a porta.
Daí por diante, seguiu-se a mais bizarra encenação. O indivíduo, a cada tentativa frustrada de ingresso na agência, tirava uma peça de roupa, até restar somente de cuecas. A essa altura uma pequena multidão já se formara e se indignava com a atitude dos prepostos ou empregados do banco, afinal, o indivíduo seminu não poderia ter mais nada que o impedisse de ingressar na agência.
Resultado: o banco foi condenado rapidamente a indenizar àquele cidadão, moralmente ofendido, com vultosa quantia.
O banco, mesmo vencido, insistiu na investigação e restou comprovado que aquele indivíduo havia escondido na cueca (peça que ninguém ousaria solicitar que retirasse) algumas moedas, causa do travamento da porta.
Há inúmeros outros exemplos de má-fé que poderiam ser citados, mas, o que interessa é que, por causa desse maus cidadãos, o Judiciário mudou de atitude em relação ao dano moral e começou a trabalhar conceitos necessários como a distinção entre os dissabores do cotidiano e o dano moral realmente existente.
Em seguida, começaram a surgir decisões judiciais e avaliações de juristas respeitáveis, segundo as quais a indenização ao ofendido representaria enriquecimento sem causa ou enriquecimento ilícito, e, naturalmente, passaram a tarifar o dano moral.
Décadas de estudo a respeito do dano moral quedaram mortalmente feridas. Como ousam, esses juristas e aplicadores do Direito, afirmar que alguém, vitorioso em um processo democrático, de Direito, em paridade de armas, não faça jus ao valor da condenação que recai sobre o ofensor, sob o argumento de enriquecimento ilícito ou sem causa?
Ora, ilícito é o que se obtém contra a lei. Como dizer que seja ilícita uma condenação derivada do devido processo legal? Como se dizer, sem causa, se foi exatamente a agressão moral que motivou a condenação?
De tudo, o que menos interessa é se de um processo regular alguém se torne rico, milionário mesmo, se o que se persegue é a função social da norma?
O que importa é repercussão social da aplicação da norma. É o seu caráter pedagógico. O fato de se ter um milionário como resultado da demanda é o que menos interessa. Importante, mesmo, é que a sociedade entenda que deve se comportar com respeito à dignidade das pessoas.
O PL, abaixo transcrito, é o golpe fatal em toda construção doutrinária acerca do dano moral. Com o dano moral tarifado, em primeiro lugar, estaremos quantificando o que, por consenso mundial, não é quantificável; sentenças judiciais serão tidas por meios ilícitos ou sem causa de enriquecimento; o caráter pedagógico das penas, reduzido a mera ficção.
Fico a imaginar a tabela! Filho humilhado na escola = R$ 10,00; sujeito desrespeitado em estabelecimentos comerciais = R$ 15,00; e por aí vai!
Nos EUA, p. ex., não há esses pruridos de falsa moral. A sociedade comemora quando alguém resta milionário em um processo dessa natureza. Por aqui, a lógica é outra... Moral vale menos; cidadão quase nada; respeito à ciência do Direito, nada!
Se é vontade social que desses processos não restem milionários, mais razoável seria um PL que determinasse ao órgão judicante que, em sua sentença, determinasse o valor devido, proporcional e razoável, à vítima do dano moral, e a diferença, que fosse dirigida a instituições, sem fins lucrativos, de natureza filantrópica, p. ex., de forma que a finalidade pedagógica da condenação seja alcançada e horizontalizada socialmente.
Não se pode extrair da norma sua finalidade pedagógica.
RMG
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01/07/2010 17:38
Câmara aprova parâmetros para indenização por danos morais
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania aprovou nesta quarta-feira regras para fixar indenizações por danos morais. Pelo texto (Projeto de Lei 1914/03), o juiz deve evitar que a medida seja usada para enriquecimento indevido de quem reclama ter sofrido o dano. Como tramita em caráter conclusivo nas comissões, a proposta segue para o Senado, a não ser que haja recurso para ser analisado no plenário da Câmara.
O PL, do ex-deputado Marcus Vicente, determina que, ao fixar o valor, o juiz leve em conta a situação econômica do ofensor, a intenção de ofender, a gravidade e a repercussão da ofensa, a posição social ou política do ofendido, além do sofrimento decorrente da ofensa.
O relator, deputado Regis de Oliveira (PSC-SP), recomendou a aprovação do projeto, que altera o Código Civil (Lei 10.406/02). "De fato, muitas ações de reparação de dano moral se transformaram em expedientes para a obtenção de vantagem indevida por parte das supostas vítimas", disse.
Oliveira preferiu essa proposta em lugar de outras três, que tramitavam em conjunto –os PLs 7124/02, do senador Antonio Carlos Valadares (PSB-SE), 1443/03, do ex-deputado Pastor Reinaldo, e 7329/10, do deputado Ratinho Junior (PSC-PR).
Segundo ele, esses projetos ferem a Constituição ao tentar definir o que pode ou não ser considerado dano moral. Além disso, ao citar danos que poderiam ser provocados por veículos de comunicação, os projetos, na opinião do relator, ferem a liberdade de imprensa.
As propostas rejeitadas também fixam valores para a reparação por danos morais. Para o relator, a medida limitaria o poder do juiz. “O correto seria deixar a fixação do valor para a apreciação de cada caso”, disse.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
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PROJETO DE LEI Nº___ , DE 2003
(Do Sr. Marcus Vicente)
Altera a redação do art. 953 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que institui
o Código Civil.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta lei fixa parâmetros para a fixação da indenização por danos morais, prevista no art. 953 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.
Art. 2º O art. 953 da Lei nº 10.406, de10 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 953. ..................
§1º Se o ofendido não puder provar prejuízo material, caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das circunstâncias do caso e de acordo com o disposto no parágrafo seguinte.
§2º Na fixação da indenização por danos morais, o juiz, fim de evitar o enriquecimento indevido do demandante, levará em consideração a situação econômica do ofensor, a intensidade do ânimo de ofender, a gravidade e repercussão da ofensa, a posição social ou política do ofendido, bem como o sofrimento por ele experimentado (NR).”
Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
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JUSTIFICAÇÃO
Num país dedimensões continentais como o nosso, limitar-se a lei civil a referir que o juiz deverá agir “eqüitativamente, na conformidade das circunstâncias do caso”, como parâmetros para a fixação da indenização pordanos morais, é temerário.
O julgador deve ter um balizamento da lei, ainda que mínimo, pois, como assevera HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, em sua obra Dano Moral (Ed. Juarez deOliveira, 3ª ed., 2000, p.36):
“Impõe-se a rigor são observância dos padrões adotados pela doutrina e jurisprudência, inclusive dentro da experiência registrada no direito comparado, para evitar-seque as ações de reparação de dano moral se transformem em expedientes de extorsão ou de espertezas maliciosas e injustificáveis.”
Cremos que o novo parágrafo que pretendemos ver inserido ao art. 953 do Código Civil auxiliará os magistrados brasileiros a alcançarem um arbitramento justo e equânime na fixação do dano moral, em benefício de toda a coletividade.
Estamos certos, assim, de contar com o apoio dos nobres Pares para a aprovação deste projeto de lei.
Sala das Sessões, em de de 2003.
Marcus Vicente
Deputado Federal
PTB/ES
Fonte: Camara dos Deputados
Roberto,
ResponderExcluirTalvez você já tenha lido, mas recomendo a leitura: http://bit.ly/aByPOb
Nesse caso, concordo com o colunista Paulo Nogueira. A família de Eliza Samudio tem que ser indenizada. Ela pagou com a vida, ao que tudo indica, ao ter seus pedidos de socorro ignorados. Apontada como "Maria Chuteira", foi (e é) considerada menos vítima. De Eva a Eliza, passando pela Geisy, pelas mutiladas para não sentirem prazer sexual, pelas adúlteras apedrejadas, mulheres são julgadas pela "moral e bons costumes" e, por isso, condenadas como "provocadoras" das agressões e mortes que sofrem.
Que os criminosos e os omissos comecem a pagar pelos crimes e pelo preconceito. E sem tarifação!
Nina,
ResponderExcluirConcordo absolutamente com tudo o que você disse. De fato, a família dessa mulher, covardemente assassinada, merece indenização superlativa, até porque ela havia denunciado o fato que, certamente por machismo, não foi levado a sério.
Dito isso, arrisco afirmar que o Estado foi co-autor nesse crime, por omissão (os juristas certamente me censurarão, porque não há, em tese, co-autoria por omissão).
Abraço,
RMG